Disciplina – de que jeito?

Na questão da disciplina, passamos, nas últimas décadas, de um extremo de autoritarismo e total repressão da liberdade para outro, em que o aluno deve ser poupado e deixado à própria sorte. Os extremos são sempre perigosos. Refletir sobre o tema da disciplina é tentar resgatar o equilíbrio perdido entre esses dois pontos.

Educar envolve a avaliação constante dos erros e acertos, bem como a reconstrução de valores. É um processo a ser vivido e construído junto com as crianças, e a disciplina faz parte do processo educacional.

A indisciplina é talvez hoje um dos grandes problemas das instituições de ensino e um dos que mais afetam a motivação do professor. A relação em sala de aula é uma situação rica de interação social e requer uma harmonia, que permita o desenrolar do processo ensino-aprendizagem de forma criativa e, portanto, produtiva. Essa harmonia só ocorrerá se houver disciplina. Ela é também fundamental para criarmos um ambiente sadio de desenvolvimento educacional do aluno, no qual ele saberá lidar com seus impulsos e emoções.

O que é disciplina?
Como cristãos, nosso alvo ao disciplinarmos nossos alunos deve ser levá-los ao autocontrole e, mais que isso, buscar os padrões de Jesus para que possamos viver em comunhão. A disciplina deve levar o aluno ao amadurecimento. Jesus deseja que cresçamos na unidade da fé, no conhecimento dele e na maturidade (Ef 4.13).

Disciplina relaciona-se com moldar, ensinar, instruir, controlar, corrigir, respeitar e até orar, buscando orientação quanto às dificuldades que estivermos enfrentando no relacionamento com nossos alunos.

Disciplina não pode ser confundida com castigo. De acordo com o Dr. Narramore, “disciplina é instrução ou treinamento dado para corrigir o mau comportamento e desenvolver a pessoa que foi disciplinada. Não envolve justiça, castigo ou vingança. Castigo é pena infligida ao culpado como retribuição. O castigo tem a justiça como seu objetivo, e não a reforma ou o desenvolvimento pessoal.”

Por que tanta indisciplina?
Família
O lugar ideal para inspirar na criança os valores disciplinares é o lar, devido aos fortes vínculos afetivos. Mas infelizmente vemos hoje claros sinais de adoecimento nos relacionamentos familiares. Como educadores, temos o desafio de estreitar os laços com as famílias de nossos alunos e trabalhar em prol do fortalecimento delas.

Influência da mídia
A própria mídia, especialmente a televisão, fornece exemplos de valores distorcidos e enfraquecem a autoridade de pais e professores. A criança tem uma tendência a imitar. Passando grande parte de seu tempo envolvida com a televisão, é natural que acabe reproduzindo o que viu.

Aumento da agressividade
Temos acompanhado, nos âmbitos nacional e internacional, notícias diárias de atos de violência nas escolas. São mortes, atentados contra professores, comportamentos diversos que cada vez mais distanciam a escola de sua verdadeira função — contribuir para a formação de seres humanos responsáveis, que possam cooperar para a construção de uma sociedade melhor.

Professor
Quando têm oportunidade, os próprios alunos apontam alguns problemas relacionados ao professor: autoritarismo, baixa qualidade e criatividade nas aulas, conteúdos incompreensíveis e desinteressantes, ausência de desafios e de regras claras.

Aluno
Nos problemas específicos com os alunos, é importante sempre tentar compreender as razões por trás da indisciplina. Alguns adquiriram esse estilo de relacionamento na família. Outros encontram, nos comportamentos indisciplinados, uma forma de expressar raiva e hostilidade contidas. Há ainda aqueles que construíram uma reputação de indisciplina (são respeitados pelo grupo) e não querem se livrar dela. A indisciplina sempre pode ser vista como forma de comunicação. Por ela, de forma inconsciente, o aluno diz algo sobre si e sobre suas necessidades. Fazer uma leitura adequada e intervir positivamente é o grande desafio do educador.

Construindo as regras
De acordo com Piaget, a ética e a cidadania são construídas socialmente a partir das vivências partilhadas desde a mais tenra idade. Portanto, os professores devem proporcionar a participação dos alunos na construção das regras e na resolução dos conflitos cotidianos. Assim estarão desenvolvendo neles, entre outras coisas, o sentido ético, o aprendizado da vida em comunidade e o respeito ao próximo.

A construção das regras em sala de aula tem como objetivo mais amplo contribuir para uma atmosfera de respeito mútuo, na qual professores e alunos pratiquem a cooperação e desenvolvam a responsabilidade. Quando têm oportunidade de participar da construção das regras, as crianças podem compreendê-las melhor, verificar sua necessidade e se sentirem mais responsáveis em cumpri-las.

É importante o professor ter claro o seu papel como líder desse processo, estando atento a que todos participem e contribuam, orientando as crianças a refletirem de forma mais ampla sobre suas sugestões e ajudando-as a redirecionarem suas posições quando diante de coisas que não podem ser efetivadas.

Sabemos que você, educador, está diante de um dos maiores desafios de nossa época: o de construir um ambiente saudável, em que o processo de aprendizagem e de formação de nossas crianças ocorra da melhor forma possível e para o benefício de todos. Contudo, não deixe de tentar, não se prenda aos métodos antigos, uma vez que a situação é nova, não abra mão de seus valores, não construa sozinho a disciplina. Ainda tem jeito.

Peça Já!
Traduzimos quatro artigos da revista Alcanzando Los Niños (edições nos 7 e 10), que aprofundam a discussão sobre a disciplina, tema de capa desta edição. Estão disponíveis em português, via e-mail. Os artigos são os seguintes:
1. Educando o caráter
2. Duros ou amorosos?
3. Formando o caráter em meio à crise
4. Respostas para pessoas que trabalham com “crianças difíceis”

Você não encontrou resposta para aquela situação específica de indisciplina? Envie-nos um relato breve da situação que mais o preocupa. Buscaremos ajuda com alguns especialistas, compilaremos suas respostas e enviaremos para você

 

Autor(a): Nelma Cristina Medeiros Lobo, é psicóloga e psicopedagoga, tem especialização em inteligências múltiplas e emocional. Coordena junto com Solange Villon Kohn Pelicera elaboração e implantação do Programa Oriente, um programa de orientação curricular para os projetos parceiros da Compassion do Brasil.

Autor(a): Villon Kohn Pelicer, é pedagoga, tem especialização em inteligências múltiplas e emocional. Coordena junto com Nelma Cristina Medeiros Lobo elaboração e implantação do Programa Oriente, um programa de orientação curricular para os projetos parceiros da Compassion do Brasil.