Estamos deixando entrar água em nossos barcos!

Conversa de uma mãe com a diretora de um dos projetos parceiros da revista Mãos Dadas: *

“Eu vim aqui conversar porque eu não estou de acordo com o que aconteceu ontem com o Fabinho. Ele chegou em casa reclamando que o braço tava doendo muito. Levei-o ao posto e de lá nós fomos parar no hospital. Fizeram um raio-x. O braço quebrado dele está quebrado!

Aí eu apertei ele e acabou me contando que tinha caído do pé de ameixa lá da creche! Eu sei que ele é muito danado, mas a senhora não acha que a professora precisava pelo menos ter levado ele em casa e me avisado?”

 

edicao16_p6Das embarcações mencionadas na Bíblia nenhuma é tão fascinante quanto a arca de Noé. Ela ilustra muito bem a salvação que temos em Jesus Cristo: só sobreviveu ao dilúvio quem nela entrou. E a arca tinha também a mesma missão de todas as embarcações: conduzir em segurança seres humanos, que não são totalmente adaptados à água, como gostariam de ser. O barco existe para contornar uma fraqueza e evitar um perigo certo: morte por afogamento.É curioso notar o número de instruções específicas dadas por Deus a Noé. Ele ditou a altura, a largura e a profundidade da arca. Determinou também o tamanho da porta, e a sua posição, número de andares da arca, e até o tipo de madeira (cipreste) e material para calafetá-la por dentro e por fora (betume).

Já pensou se Noé fosse do tipo que não gosta de seguir normas? Lá pelo trigésimo dia do dilúvio ele perceberia que o casco estava começando a vazar! Provavelmente por economia, usara o betume1 somente pelo lado de fora. Por dentro usara uma resina natural mais fácil de manusear e com um cheiro menos desagradável. Chamaria a família para uma reunião urgente. Decidiriam aliviar a carga jogando fora os animais mais pesados… Você pode imaginar o resto.

Se Deus, na sua soberania, se importou com normas de segurança para salvar a criação, você não acha que nós também precisamos fazer tudo ao nosso alcance para conduzir a criança, obra-prima de Deus, por sobre as águas turbulentas de um mundo mal com todo o cuidado e segurança?

As normas para manter o ambiente de nossos projetos sociais, escolas e igrejas livres de perigos para as crianças não nos foram ditadas por Deus. Mas temos o discernimento (oferta do Espírito Santo); a experiência (oferta de muitos colegas espalhados pelo mundo); e as normas do país(estabelecidas pela lei e pelos organismos de controle presentes em nossa sociedade).

A lista abaixo apresenta os buracos mais comuns encontrados nos cascos de nossas arcas (organizações sociais cristãs) e que favorecem a violação dos direitos das crianças dentro dos projetos.

1. Contratação irregular de funcionários. Sem fazer uma boa triagem, correndo o risco de empregar pessoas não-idôneas e até mal intencionadas.

2. Não cumprimento das leis trabalhistas. Às vezes a pessoa recebe uma quantia muito pequena e trabalha muitas horas sem o vínculo trabalhista adequado.

3. Desrespeito às normas da Secretaria de Educação quanto ao número de crianças por turma, aspectos físicos das dependências etc.

4. Desrespeito às normas de segurança do Conselho de Segurança Alimentar.

5. Desconhecimento e desrespeito ao Estatuto da Criança e Adolescente bem como a desarticulação do projeto com os órgãos de proteção da criança (Conselho Tutelar e Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente)

6. Desconhecimento e desrespeito à Convenção sobre os Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas que nos fornece uma lista de direitos fundamentais da criança como o direito de ser tratada com igualdade e de ser ouvida sobre questões que afetam a sua vida.

7. Desobediência aos preceitos de Deus com relação à criança, tratando-as como seres secundários e não os primeiros no reino dos céus.

Há brechas em nossas arcas. Está na hora de fechá-las! As crianças merecem uma viagem mais tranqüila. Não sejamos ingênuos, do lado de fora, a tempestade continua fazendo muitos estragos!

 

“Queridos da Revista Mãos Dadas, *

Estou vivendo uma situação muito difícil e não sei o que fazer. Há alguns meses comecei a trabalhar numa escola como supervisora suplente. Porém estou assustada. O lugar onde se deveria oferecer às crianças proteção contra todo abuso e maus-tratos, é onde mais se pratica essas coisas.

Eu assisto todos os dias alguns funcionários, principalmente os mais antigos, tratando as crianças com grosseria e falta de respeito. Não há diálogo, as crianças não são ouvidas e nunca têm razão. Já ouvi gritos, falas agressivas e humilhação. Já vi cara feia, testa franzida e dedo na cara. E estes funcionários se consideram os “donos” da escola. Não estão abertos a conversa, menos ainda a sugestões de novatos.

Ainda não sei o que fazer, por hora só sofro junto com as crianças. Alguma dica?”

Márcia

 

“Olá pessoal de Mãos Dadas! *

Ontem passei um grande aperto. Na hora do pátio um grupinho que brincava dentro da sala começou a se desentender. A princípio eu apenas observei, torcendo para que conseguissem resolver o problema. Mas de repente uma menina ficou muito perturbada. Tina, a menina mais velha e mais forte da turma, passou a agredir os colegas. As outras crianças gritavam: “Tina fedorenta, varredora de rua”, e eu fui obrigada a segurá-la para que não acertasse um chute ou um murro nos colegas. Tentei acalmá-la dizendo: “Calma, Tina, por acaso você é fedorenta varredora de rua?”. Então ela respondeu chorando muito e partiu meu coração: “Eu sou, tio; eu sou!”. Quando ela não está no projeto, ajuda seu pai, que é gari do bairro onde mora; e ela sente muita vergonha disso. Sinceramente, não sei como ajudá-la nem como evitar que uma criança machuque a outra com falas tão duras! Vocês têm algum material sobre isso?”

Sérgio

* As cartas são baseadas em fatos reais, mas os nomes são fictícios.

Nota
1. Massa parecida com o asfalto, usada para tapar frestas.