A maioria de nós não conhece um tsunami. A ciência explica como um maremoto acontece. Nós, porém, somente sentimos os efeitos desse modo como a natureza age e reage. Apesar disso, os seres humanos conseguem superar essas ondas de morte e encontrar caminhos de sobrevivência, como adaptar-se ao ambiente atingido pela tragédia, reconstruir com criatividade suas casas ou fortalecer a solidariedade.
Continuo acreditando na compaixão dos seres humanos. Ainda há muita sensibilidade quando encontramos dor e sofrimento. Por um lado, fico assustado com algumas ondas que nos afogam: guerras sem fim e genocídios sem controle. Por outro, fico encantado com a capacidade das pessoas para encontrar novos caminhos de preservação de toda a criação. Mesmo limitados, ainda é possível ressuscitarmos pedacinhos da imagem e semelhança de Deus que há dentro de nós.
Ondas do mal
O tsunami é uma pequena ilustração do que ocorre diariamente no mundo. Milhares de pessoas morrem por causa de decisões políticas erradas ou por omissão. Fico decepcionado com estruturas religiosas que, às vezes, servem de apoio para quem pratica o mal. Os fenômenos não-racionais da natureza matam menos do que as ações “inteligentes” dos desumanos.
A fome e a morte de milhões de crianças vêm do abismo de desigualdades entre ricos e pobres — um tipo de “tsunami econômico” cruel. Suas águas formam um rio constante de injustiças. A guru Mata Amritanandamayi doou 23 milhões de dólares para socorrer as vítimas na Ásia. Se doou tudo isso, então qual o seu patrimônio? O piloto Michael Schumacher doou 10 milhões. Não estou condenando a aparente atitude generosa dessas pessoas. Estou apenas ilustrando que diariamente milhares de pessoas morrem por causa da acumulação e da apropriação injusta dos bens que deveriam ser usados para o bem comum.
Há ondas em nossas comunidades que matam tanto quanto o tsunami: a violência familiar, o abandono de crianças inocentes, o descaso com as escolas e os postos de saúde, a exploração do trabalhador, entre outras.
A missão de fazer o bem
Temos uma missão: alcançar pessoas que aceitem os ensinos de Jesus Cristo e, por causa disso, tenham sede de fazer o bem e lutar contra o mal (Rm 12.9, 17, 21). Nossa tarefa é ajudar a construir comunidades unidas, justas e comprometidas com o reino de Deus. Onde devemos fazer missão? Em todo lugar aonde os cidadãos do reino possam chegar. Onde existir um filho, uma filha de Deus, ali já se firmou um espaço para que o Senhor seja revelado. Jesus disse: “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (Jo 17.3). Que as nossas vidas, palavras, obras e sinais comuniquem a presença de Deus em comunidade.
Precisamos acender a tocha da esperança contra toda forma de desespero. Devemos abrir os canais para que a justiça corra como um rio em nossas comunidades; erguer a bandeira da paz no meio de tanta violência; viver o amor demonstrado em atos de justiça e misericórdia em favor das vidas ameaçadas pelas ondas escondidas bem perto de nós.
Oro por todos os homens e mulheres que estão engajados na luta contra a morte e o mal que se aproxima, e que cultivam e praticam o bem. Que Deus nos ajude a desvendar os fenômenos escondidos no nosso coração e nas estruturas sociais e políticas. E, mais do que isso, que ele nos dê a capacidade de começar tudo outra vez, apesar da dor e do sofrimento de nossos irmãos e irmãs, longe ou perto de nós.
Autor: Carlos Queiroz, casado, dois filhos, é pastor da Igreja de Cristo, em Fortaleza, CE. É diretor executivo da ONG Diaconia e autor de Ser É o Bastante – felicidade à luz do Sermão do Monte (Editora Ultimato, Encontro Publicações, Visão Mundial, 2006).