Mudar o quadro da infância e adolescência em situação de rua é um desafio que exige de todos nós disponibilidade e paciência e a ação efetiva de Conselhos Tutelares (CT), Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), Centros de Referência Especializados da Assistência Social (CREAS). Veja a seguir o que você pode fazer diante de algumas situações.
“Não sei se ele ou ela é uma criança em situação de rua.”
Converse com a criança e conheça a situação dela. Ela passa o dia na rua? Apenas trabalha na rua? Frequenta a escola? Mora na rua? Tem algum vínculo familiar? Usa drogas? Qualquer uma dessas situações significa um direito negado — abra a boca em favor dessa criança!
“Acho que a criança não quer ajuda.”
É seu dever como cidadão não cruzar os braços. Após levantar as informações acima você deve procurar o Conselho Tutelar e fazer uma denúncia. Essa denúncia pode ser por escrito (papel ou e-mail), por telefone, pessoalmente ou via SIPIA (www.sipia.gov.br) que é o Conselho Tutelar na internet. Sugiro que faça a denúncia por escrito, em duas vias e fique com a via assinada como recebida. Para fazer a denúncia você não precisa saber onde a criança mora com a família ou sozinha, basta dizer onde o Conselheiro Tutelar pode encontrar a criança: a rua onde ela costuma estar, o estabelecimento em cuja porta ela pede alimento, ou em qual semáforo etc.
O Conselho Tutelar deve procurá-la, conversar com a família, se tiver, e fazer um relatório da situação da criança. Esse relatório deve então se tornar uma denúncia junto ao Ministério Público, que pode ser contra o Estado ou contra a família. O CT deve também encaminhar a criança ao CREAS para receber os cuidados necessários.
“Fiz a denúncia, mas a criança continua na mesma.”
O CT pode alegar que não tem gente disponível para fazer essa tarefa, nesse caso o CT deve procurar as Secretarias de Assistência Social ou de Direitos Humanos para que seus educadores façam a abordagem nas ruas ou na casa da criança ou adolescente.
Se o CT fez sua parte, mas o processo não andou, então ele parou no CREAS, que realmente realiza a ação para garantir o direito da criança. Vá até lá e mostre seu interesse pelo caso, educadamente cobrando ações. O CREAS é o responsável por encaminhar a criança para uma casa de acolhimento, família acolhedora, tratamento psicológico, entre outros. O CREAS também deve providenciar documentos e matrícula em escola, se for o caso.
“O problema é maior do que eu esperava, a criança usa drogas, é explorada pelo tráfico e tem medo de fazer qualquer denúncia.”
Esse caso pede um atendimento especial em casa de apoio a dependentes químicos. É necessário incluir essa informação na denúncia ao Conselho Tutelar, para que ele encaminhe a criança para o local adequado. Não se preocupe, pois os relatórios elaborados pelo Conselho Tutelar são mantidos em sigilo e compartilhados apenas com o Ministério Público ou outros órgãos responsáveis.
“Visitei a casa de acolhimento e não gostei do que vi.”
Todas as casas de acolhimento devem seguir as normas dos “abrigos” e atender a todos as exigências legais para garantir o desenvolvimento integral da criança. Se o abrigo não está de acordo com essas normas, use sua influência para melhorar o que pode. Antes de atirar a primeira pedra, tente verificar o que de fato está acontecendo e como isso pode ser melhorado. Em casos mais graves você deve novamente recorrer à denúncia por escrito, dirigida ao Conselho Tutelar, que a encaminhará para o Ministério Público, que decidirá sobre a intervenção a ser feita. Você não pode transferir uma criança de um espaço de acolhimento para outro, mas pode exigir do Conselho Tutelar ou do Juizado da Infância e da Adolescência uma resposta rápida para o caso.
“Na minha cidade não existe um programa de enfretamento à situação de rua, nem casas de acolhimento.”
O Brasil ainda não possui uma política pública nacional de enfrentamento à situação de rua para crianças e adolescentes. Ajude as campanhas existentes, como a mobilização “Criança Não é de Rua” (www.criancanaoederua.org.br). Esta ação dará muita força às ações de organizações e educadores. Algumas cidades já aprovaram uma política pública municipal. Verifique se a sua cidade é uma delas. O CMDCA é o órgão responsável por executar essa política, procure-o e verifique o andamento dessa política na sua cidade. Una forças com um(a) vereador(a) amigo da criança. Pegue o telefone dos vereadores na Prefeitura e ligue para todos, incentive-os a comprar sua causa e não desista até que um deles aceite o desafio.
E lembre-se: não trabalhe isoladamente, forme um grupo na sua igreja ou comunidade para prestar apoio mútuo, discutir estratégias e orar! O que você se propõe a fazer não é heroísmo e sim obediência ao Pai, que o adotou e o comissionou para esta tarefa. Ele não deseja que ao menos um dos pequeninos se perca.
Consulte sempre o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) ele é o principal instrumento para saber quais direitos são negados e como recorrer para garanti-los.
Nota
Esse guia foi escrito com o apoio do movimento “Criança não é de Rua”. Veja o comentário “Como a situação de rua agride os direitos fundamentais da criança” acessando www.maosdadas.org/ineditos
Autor(a): Tábata Mori é jornalista e poetisa, coordenadora de comunicação de Asas de Socorro, voluntária da Rede Mãos Dadas, da Aliança Bíblica Universitária do Brasil.
Revista Mãos Dadas Edição 27 – Guia Prático