Resgatando a memória

Ações em favor dos oprimidos, sejam elas de natureza verbal (denúncias, exortações etc), sejam de natureza concreta (ações práticas, de assistência, de ação social ou de transformação), não são uma exclusividade da igreja de hoje. A história da implantação das igrejas no Brasil mostra muitas iniciativas de pioneiros, estrangeiros e brasileiros em favor dos oprimidos.

Um exemplo disso é o envolvimento do Dr. Kalley (1809-1888), médico e missionário escocês, que sempre considerou sua clínica médica parte integrante do seu ministério cristão. O Dr. Robert Reid Kalley e sua esposa Sarah Poulton Kalley foram os fundadores da Igreja Congregacional no Brasil.

No dia 3 de novembro de 1865, preocupado com o fato de Bernardino de Oliveira Rameiro, membro de sua igreja, possuir escravos, Kalley fez uma exortação, expondo seu ponto de vista sobre a escravidão:

Há diferença entre as coisas que me pertencem e as coisas que pertencem aos outros. Por exemplo, a mim me pertencem os olhos, os ouvidos, a boca, as mãos, os pés etc; conheço bem o que sinto nestas partes do meu corpo. A outro indivíduo pertencem órgãos semelhantes…, mas esses órgãos não são meus, e os meus não são dele; tenho direito aos meus como ele tem direito aos seus. Além de ter direito à posse dos órgãos que representam dádivas do Supremo Criador, o homem tem também o direito de tomar posse dos frutos, obtidos pelo exercício desses órgãos, de modo honesto e justo. […] O que Deus dá ao escravo é para ser usado por ele, em seu próprio proveito. É escravo? Ninguém tem o direito de fazê-lo escravo, roubando-lhe a liberdade pessoal, negociando com uma criatura humana, como se ela fosse uma máquina ou um objeto qualquer! Cada um tem de dar contas do que faz ao Altíssimo Juiz, quando obriga um semelhante seu a trabalhar, contra a vontade dele, sem salários e sob ameaças de castigo e sofrimentos diversos, para produzir em seu favor (do senhor, que o maltrata injustamente) bons serviços e excelentes lucros. Isto é um roubo violento dos dons que o Criador concedeu ao pobre estrangeiro, que não é uma criatura diferente do senhor, que o comprou!

Referência:
REILY, Duncan. História documental do protestantismo brasileiro. 1. ed. São Paulo: ASTE, 1984.