Transformado e transformador

Valdemy era um garoto franzino e pequeno. Ele e seus onze irmãos (cinco meninos e seis meninas) trabalhavam duro roçando matos, plantando e fazendo tarefas manuais. O pai era exigente. Diante da imensa pobreza, não permitia que nenhum dos filhos deixasse de trabalhar. A realidade era amarga para aquele menino.

Valdemy vivia num lugarejo chamado Sítio Caroá, a onze quilômetros de Manaíra, na Paraíba. Ele nasceu em 1966. No povoado não tinha energia elétrica, transporte público nem estradas boas. A escola funcionava uma vez por semana, com professores que só sabiam ler e escrever. Localizada numa região de muita seca, a comunidade tinha um coração amargurado. Valdemy cresceu com um sentimento forte de revolta porque, segundo ele, “trabalhava tanto e não tinha nada na vida; não era justo”.

Valdemy sobrevivia limpando terrenos e roças, mas o que ele recebia por um dia de trabalho valia apenas o preço de uma lata de óleo de cozinha.

Valdemy sobrevivia limpando terrenos e roças,

mas o que ele recebia por um dia de trabalho

valia apenas o preço de uma lata de óleo de cozinha.

Na adolescência, ele soube que o sr. Sebastião Anta havia se tornado “crente”, ouvindo pregações pelo rádio. Desde então, Sebastião não parava de exortar sobre os pecados da comunidade. Isso deixava Valdemy furioso e incomodado: “Ele falava com firmeza”. Com o passar dos dias, os vizinhos, incluindo Valdemy, começaram a levar a sério as palavras de Sebastião. Em 13 de março de 1983, aos 17 anos, Valdemy decidiu entregar o coração a Deus. Daí por diante, a história dele e de toda a comunidade de Sítio Caroá não seria mais a mesma. Mas a vida não ficou fácil. Valdemy sobrevivia limpando terrenos e roças; o que ele recebia por um dia de trabalho valia apenas o preço de uma lata de óleo de cozinha. Às vezes, andava 30 quilômetros à procura de emprego.

Mas a revolta de Valdemy foi dando lugar a uma vontade imensa de ajudar os outros. Ele avalia assim: “Antes, quando eu via algum problema, partia para a briga; hoje, a gente conversa.”

Os moradores de Sítio Caroá zombavam dos crentes e achavam que o lugar não crescia por causa deles. Valdemy percebeu, então, que a melhor maneira de mudar aquela opinião era buscar soluções para os problemas sociais da comunidade. Recebeu o apoio da EMATER, com assistência técnica, e da Ação Evangélica (ACEV), com perfuração de poços e construção de casas. As famílias do lugarejo também começaram a confiar mais nele e na igreja que se formava.

Em 1997, Valdemy foi eleito o primeiro presidente da Associação Comunitária de Sítio Caroá. “De lá para cá, nunca mais parei. Não posso; só quando Jesus voltar”, conta Valdemy, que foi presidente da associação por oito anos seguidos. Durante esse tempo, Sítio Caroá experimentou progresso: mais poços foram perfurados levando água potável e condições de vida às famílias, uma escola de reforço escolar foi inaugurada e a falta de perspectivas para os jovens deu lugar a um crescimento de 60% no número de casas na comunidade. Hoje, o povoado é exemplo de desenvolvimento social para outros bairros. Ao redor da pequena congregação evangélica de Caroá, nasceram dez igrejas.

Atualmente, Valdemy Vieira de Andrade, 40 anos, é pastor de uma igreja de sessenta pessoas, é agente municipal de saúde e responsável pela supervisão das igrejas da ACEV em toda a região de Manaíra. Concluiu o ensino fundamental recentemente. Ele tem cinco filhos e dois netos.

Perguntado sobre o que significa missão integral, Valdemy diz: “Ah! O pessoal fala demais sobre isso. É não se preocupar só com a salvação das pessoas, mas também com a vida, como o próprio Jesus. O amor de Deus é muito mais que salvação da alma, né? Sem ele, acho que eu nem existiria mais”.

*Manaíra fica no alto sertão paraibano e sofre com diversos problemas sociais, como a baixa escolaridade. O município possui cerca de 8 mil moradores com mais de 10 anos de idade. Desses, 28% têm menos de um ano de estudo. (Fonte: IBGE, 2001.)

Notícia: Caroá em breve terá internet (21/11/2007)