Dia 7: “O cristão não dá, ele devolve”

Porque tudo pertence a Deus: “Ao Senhor pertence a terra e tudo o que nela se contém, o mundo e os que nele habitam” (Sl 24.1). É próprio de Deus fazer isso conosco. É uma brincadeira pedagógica. Primeiro Ele nos dá porque é bondoso e gosta de dar. Mas Ele quer também nos ensinar o prazer que existe no ato de doar. Em Atos 20.35 Paulo disse: “Tenho-vos mostrado em tudo que, trabalhando assim, é mister socorrer os necessitados e recordar as palavras do próprio Senhor Jesus: mais bem-aventurado é dar que receber”. Muitas vezes colocamos a mão no bolso temerosos, querendo proteger o que é nosso. Temos o direito de escolha: nos prender ao prazer passageiro de ter ou descobrir um outro prazer bem mais duradouro, que é o
de dar. Esse ato torna a criatura mais semelhante ao Criador e Doador da vida.

É possível criar uma rede de proteção à criança e ao adolescente em risco sem a igreja?

Não, porque a igreja é capaz de transformar fruto finito em fruto eterno.

Terezinha e Daison são amigos até hoje. Pertencem à velha guarda que nos anos 80 organizaram a ação social da Igreja Presbiteriana de Viçosa, criando uma creche para crianças carentes. Certa ocasião foram visitar a Cida, que um mês antes havia recebido uma caixa enfeitada contendo roupas para o enxoval do bebê que teria. Embora usadas, as roupinhas estavam em ótimo estado.

Terezinha e Daison entraram no barraco de pau-a-pique. Cida, de resguardo, não se sentia em condições de manter o ambiente limpo. Olhando ao redor, os dois visitantes constataram surpresos o destino que as roupas tiveram: estavam enfiadas nos buracos da parede onde o barro já se desprendera. Terezinha, querendo resgatar alguma peça para a criancinha, pediu que Cida trouxesse a caixa. Ao abri-la, se deparou com mais uma surpresa. O que salvou a situação foi o bom humor do Daison, que exclamou: “Que bonitinho,
seis ratinhos, todos vestidinhos em cor-de-rosa!”

Se a pessoa não estiver interessada em mudança, de dentro para fora, nossas boas ações vão sempre acabar como aquelas lindas roupinhas — tapando buracos. Muitas pessoas usam histórias como a da Cida para justificar a não-ação: “Insistir com esse povo é ‘dar pérolas aos porcos’”. Querem crer que histórias como essa constituem a regra, e não a exceção. (Veja a história da Marisa, p. 3.) Precisamos lembrar sempre o quanto Deus insiste conosco.

Por outro lado, a nossa ação tem de conjugar a sensibilidade misericordiosa (ver a necessidade da pessoa) com o discernimento espiritual (chamar a pessoa a assumir a sua responsabilidade pessoal diante de Deus).

É nesse aspecto que a igreja tem uma grande tarefa que só ela pode realizar: transformar frutos finitos em frutos eternos. Ela precisa estar ativamente engajada em transformar o conflito em reconciliação, o ódio em amor, o desespero em esperança, o imediatismo em visão de longo alcance, incluindo uma visão do
eterno, o abandono em aconchego com Deus, o medo em confiança, o perdido em salvo.

Por isso a igreja conta com três armas: a palavra, a intercessão e a ação em amor. Dessas três, a primeira tem sido usada extensivamente em detrimento das outras duas. Por essa razão a palavra de salvação tornase palavra vazia ou palavra de julgamento, à semelhança dos famigerados fariseus que tanto se opuseram a Jesus.

De que forma a sua comunidade de fé acolhe as “Cidas” que ali buscam guarida? Quem intercede pela Cida? Que tipo de ação é feita para ajudá-la a desejar mudança — mudança milagrosa e integral, que a transforma inteira, de dentro para fora e de fora para dentro?

Por Elsie B. C. Gilbert
Origem: Revista Mãos Dadas. Edição 05